21 de março de 2013

No aniversário de Glauber Rocha, uma reflexão sobre a América Latina que se liberta




O cineasta baiano Glauber Rocha completaria, nesta quinta-feira, 74 anos. Incompreendido em seu tempo, o intelectual brasileiro é cultuado, hoje, como um dos diretores mais revolucionários do cinema mundial, tanto estética quanto politicamente. O líder comunista Ernesto Che Guevara “chegou a comparar a importância de Deus e o Diabo na Terra do Sol (1964) à de Dom Quixote na literatura”, lembrou a jornalista Cynara Menezes, em sua página na internet.
“Em carta ao irmão de Che, Alfredo, o diretor conta que planejava filmar America Nuestra em memória do guerrilheiro morto, projeto nunca concretizado mas que serviu de base para o roteiro de Terra em Transe (1967). No manifesto Eztetyka do Sonho (1971), Glauber expõe alguns dos seus conceitos de arte revolucionária”, sublinhou a jornalista:
No manifesto, Glauber afirma que “as conclusões dos relatórios dos sistemas capitalistas encaram o homem pobre como um objeto que deve ser alimentado. E nos países socialistas observamos a permanente polêmica entre os profetas da revolução total e os burocratas que tratam o homem como objeto a ser massificado. A maioria dos profetas da revolução total é composta por artistas. O pior inimigo da arte revolucionária é sua mediocridade. Os sistemas culturais atuantes, de direita e de esquerda, estão presos a uma razão conservadora. O fracasso das esquerdas no Brasil é resultado deste vício colonizador”.
Segundo Glauber, “as raízes índias e negras do povo latino-americano devem ser compreendidas como única força desenvolvida deste continente. Nossas classes médias e burguesias são caricaturas decadentes das sociedades colonizadoras. A cultura popular não é o que se chama tecnicamente de folclore, mas a linguagem popular de permanente rebelião histórica. O encontro dos revolucionários desligados da razão burguesa com as estruturas mais significativas desta cultura popular será a primeira configuração de um novo significado revolucionário. O sonho é o único direito que não se pode proibir”.

Estética da fome

Glauber publicou, em plena ditadura militar, a tese-manifesto Uma Estética da Fome, que contínua e constantemente torna-se um texto fundamental para o cinema em geral e, em especial, o cinema dos países do Terceiro Mundo. Surgida num momento até certo ponto novo da história brasileira – momento em que um sistema político-econômico-social começava a ser imposto e a fechar um período pleno de inquietações manifestas -, provocou polêmicas em diversos níveis. Polêmicas que, de um certo modo, continuam existindo.
Apresentada e publicada em 1965, esteve na origem do movimento do Cinema Novo, que já havia alcançado algum prestígio internacional e despertado o interesse de críticos e cineastas estrangeiros que, até pouco tempo antes, mantinham-se distantes do cinema nacional. Uma Estética da Fome não era um estudo analítico ou crítico desse movimento, mas uma definição de seus principais compromissos, objetivos e propostas. Glauber Rocha não examinava detalhadamente os filmes que até então compunham o Cinema Novo, preferindo situá-los no panorama político-econômico-cultural da época. Este panorama, aliás, é o ponto de partida para as reflexões e propostas do autor.
O Cinema Novo filmou o mundo subdesenvolvido como origem de culturas desenvolvidas, capazes de escapar do colonialismo moderno. Foi uma forma que essas culturas encontraram para expressar, tanto aos “colonizados” como aos “colonizadores”, a realidade em que foram desenvolvidas.
Estas são algumas das questões presentes em Uma Estética da Fome. Exemplificando-o com elementos de filmes do Cinema Novo, Glauber propõe um cinema revolucionário na forma e no conteúdo, entendendo-se isto como uma arte distante tanto das preocupações mercantilistas quanto das puramente formais, uma arte comprometida com a verdade. Este cinema estaria à margem da indústria, pois, como diz o autor, “o compromisso do Cinema Industrial é com a mentira e com a exploração”.

Fonte Correio do Brasil

Assista aqui ao discurso do professor Darcy Ribeiro, no último adeus ao cineasta Glauber Rocha:


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