Jorge Mario Bergoglio, o cardeal argentino de 76
anos eleito ontem o novo papa da Igreja Católica com o nome de Francisco, em
homenagem ao santo de Assis e também ao xará Xavier que tentou evangelizar a
Índia no século XVI, pode até agradar a todos mas não a mim.
O seu passado suspeito, com graves acusações de participação na ditadura
argentina, não o credenciam a ser o pastor de 1 bilhão e 200 milhões de fiéis
espalhados pelo mundo.
Ele pode até não ser culpado, mas no mínimo
cometeu o pecado da omissão – como bem escreve hoje, na Folha de S.Paulo,
o jornalista Clóvis Rossi.
Leiam. E lamentem:
Jorge Mario Bergoglio leva ao Vaticano um pecado
imperdoável: foi no mínimo omisso durante o genocídio que a ditadura militar
argentina praticou entre 1976 e 1983.
Nem é possível alegar que não era, então, uma
figura destacada na hierarquia eclesiástica: foi provincial dos jesuítas entre
1973 e 1979. A parte mais selvagem da repressão se deu precisamente entre o
golpe de 1976 e 1978, quando, a rigor, a esquerda armada já havia sido
esmagada, junto com milhares de civis desarmados.
Há na Argentina quem acuse Bergoglio de ter sido
pior do que omisso: o jornalista Horácio Verbitsky, autor de um punhado de
livros sobre a ditadura, acusa o agora papa de ter sido cúmplice da repressão
ao denunciar aos militares, como subversivos, sacerdotes que desempenhavam
forte ação social.
Verbitsky diz possuir documentos obtidos na
Chancelaria argentina que demonstram a veracidade de sua acusação.
Antes do conclave anterior (2005), um advogado
da área de direitos humanos chegou a propor uma ação contra Bergoglio,
acusando-o de ter sido cúmplice no sequestro de dois padres jesuítas em 1976.
Bergoglio sempre negou as acusações. Disse que,
ao contrário, tentou proteger os jesuítas perseguidos.
O que não dá para negar é que Bergoglio passou
em silêncio por um período negro da história argentina, em que o comportamento
de sua igreja foi obsceno.
Não é, portanto, um cartão de visitas auspicioso
para um papa condenado a enfrentar uma evidente crise de credibilidade, se não
da igreja, pelo menos de sua cúpula.
A igreja argentina também perdeu credibilidade
por sua pusilanimidade, para dizer o mínimo, durante a ditadura militar. Como
correspondente da Folha em Buenos Aires de 1980 a 1983, fui testemunha
ocular das intoleráveis omissões da hierarquia ante a violência do Estado.
Conto apenas um episódio menor para mostrar a
covardia.
Um dado dia, as Madres de Plaza de Mayo pediram
uma audiência aos bispos. Um grupo delas, todas senhoras de idade, rostos
vincados pelo tempo e pela dor, foi até a sede da Conferência Episcopal
Argentina para entregar uma petição, obviamente relacionada à violação dos
direitos humanos.
Chovia, fazia frio, o vento era cortante. Pois
os responsáveis pela igreja argentina não tiveram nem sequer a piedade de
permitir que as senhoras esperassem no interior do imóvel. Ficaram mesmo ao
relento, como a sociedade argentina ficou desprotegida pelos seus pastores durante
toda a ditadura.
É dessa igreja que vem Bergoglio. Uma igreja que
jamais pediu perdão por esse insuportável comportamento.
É possível que, tendo a Argentina da democracia
passado a limpo o período do terror, a questão dos direitos humanos no passado
seja deixada de lado ou vá para um pé de página no perfil do novo papa.
Entendo. Os homens passam a ser santos, ou
quando morrem ou quando assumem o papado.
A ver se o papa Francisco corrigirá no Vaticano
o pecado de omissão de Bergoglio.
Fonte
– Blog do Luis Fauto
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