Por
Altamiro Borges
O autor deste Blog recomenda ler toda a reportagem da Revista Época transcrita abaixo.
O
tucano Marconi Perillo caminha para o abatedouro. Nem a mídia aliada consegue
mais esconder as revelações da Operação Monte Carlo, da Polícia Federal. A
revista Época desta semana voltou a denunciar os podres do governador de Goiás.
Na reportagem intitulada “Os três amigos”, ela revela os laços entre Perillo, o
seu irmão e Carlinhos Cachoeira. Antonio Perillo, o Toninho, aparece com
integrante do “clube Nextel” – numa referência às pessoas ligadas ao mafioso
que dispunham de rádios habilitados nos EUA.
A
reportagem, novamente assinada pelos jornalistas Diego Escosteguy, Murilo Ramos
e Marcelo Rocha, é bem documentada. Vale conferir a nova bomba:
*****
ÉPOCA
teve acesso a novas conversas telefônicas interceptadas pela Polícia Federal na
Operação Monte Carlo – que, no final de fevereiro, deslindou a infiltração do crime
organizado no governo de Goiás. A íntegra das conversas – 5,9 gigabytes de
informação – corre sob segredo de Justiça na 11ª Vara Federal de Goiânia. Nela,
encontra-se fartura de trechos inéditos – e explicitamente reveladores,
sobretudo sobre o envolvimento do tucano Marconi Perillo, que governa o Estado
de Goiás, com o esquema liderado pelo bicheiro Carlinhos Cachoeira e pela
construtora Delta.
Entre
outras novidades, há diálogos em que se diz que Perillo “mandou passar” à Delta
um contrato que poderia render R$ 1,2 bilhão. Noutros diálogos, cita-se Perillo
como responsável por ordenar, por intermédio do ex-senador Demóstenes Torres
(ex-DEM), que o diretor do Detran no Estado, indicado por Cachoeira,
contratasse uma empresa de um amigo do governador. Descobre-se, ainda, que um
irmão de Perillo, chamado Antônio Pires Perillo, ou Toninho, tinha um celular
Nextel habilitado nos Estados Unidos para conversar com Cachoeira – e que
Toninho prestou serviços a ele.
Desde
que a existência da quadrilha de Cachoeira veio a público, em fevereiro,
sabia-se que a força do grupo escorava-se, entre outros políticos, no senador
Demóstenes. O envolvimento de Perillo aparecia, até então, por indícios. Na
semana passada, Época revelou as evidências – contidas num relatório
enviado pela PF à Procuradoria-Geral da República – de que a Delta firmara um
“compromisso” político com Perillo: comprara a casa que o governador vendia,
pagara R$ 500 mil a mais do que ela valia – e passara a receber em dia o que o
governo de Goiás lhe devia.
De
acordo com as gravações, outros acertos de Perillo com as empresas ligadas ao
esquema de Cachoeira acontecem em março de 2011, logo após a venda da casa para
a Delta. No dia 1º de março, Perillo vende a casa. No dia 2, começam os
negócios. Às 21 horas, Demóstenes liga para Cachoeira. O assunto é urgente:
Demóstenes tem um “recado” a transmitir a Cachoeira. De quem? De Perillo.
Descobre-se, portanto, que a relação de Perillo com a quadrilha de Cachoeira
era ampla – envolvia não apenas seu assessor Wladmir Garcez, que acabara de
intermediar os pagamentos da Delta pela casa, mas também Demóstenes.
Diz
Demóstenes: “Fala, professor. O seguinte: tava precisando falar com
você. Ou se você não puder, manda o Wladmir (Garcez) falar comigo. Não é nada
daquele assunto, não. É outro, que apareceu agora. É um recado do Marconi.
Precisava te passar” (ouça o áudio). Cachoeira pergunta se Demóstenes está em
Goiânia. “Tô aqui”, diz Demóstenes. “Se você puder vir aqui... Se não puder,
manda o Wladmir que eu explico o que é.” Cachoeira não titubeia: “Vou aí agora então”.
Pouco
mais de meia hora depois, após o encontro com Demóstenes, Cachoeira liga para o
presidente do Detran de Goiás, Edivaldo Cardoso, conhecido como Caolho. Caolho
fora nomeado para o cargo assim que Perillo assumiu o governo, segundo a
investigação, por indicação de Cachoeira, que o encarregara de assegurar que a
Delta e demais “empresas amigas” faturassem alto não somente no Detran, onde
ele assinaria contratos e autorizaria pagamentos, mas também nas demais áreas
do governo de Goiás. Como Caolho faria isso? Graças a seu acesso privilegiado à
cúpula do governo tucano, Caolho tinha bom trânsito com Perillo e seus
assessores. Deveria ainda manter Cachoeira a par de possíveis novos projetos do
governo.
É
nesse contexto que transcorre o diálogo entre Cachoeira e Caolho naquela noite
de março – um breve, porém claro, sinal do empenho de Perillo em ajudar a
turma. Cachoeira diz a Caolho: “Tenho um recado do Marconi e do Demóstenes para
você”. Caolho pergunta do que se trata. “Por telefone é ruim, né?”, afirma
Cachoeira. Ato contínuo, Caolho pergunta se os dois podem se encontrar.
Cachoeira, cansado depois de um dia intenso e sem encontrar uma brecha na
agenda do dia seguinte, acaba transmitindo o recado de Perillo por telefone.
“Você teve com a Politec?”, diz Cachoeira. “Tive, ué”, responde Caolho. Temendo
uma bronca, Caolho se adianta e conta tudo: “Quem mandou, pediu para eu receber a Politec foi o Marconi
(Perillo). Ligou e pediu para eu receber o cara (da empresa Politec)” (ouça o
áudio). Cachoeira confirma: “Aí mas ele (Perillo) não
lembra, não. O problema é esse. Ele falou lá que você tinha que fechar (com a
Politec), o negócio deles lá”.
Caolho
explica em detalhes a ordem de Perillo para contratar a Politec. “O homem
(Perillo) que ligou para mim. O Barros (Carlos Alberto Barros, fundador da
Politec) estava lá no palácio, ele (Perillo) me ligou, falou comigo
pessoalmente para eu receber o cara lá”, diz. Cachoeira determina então que
Caolho resolva logo o contrato com os executivos da Politec: “O Demóstenes
falou para você nem chamar o Marcelo (Marcelo Augusto Gomes de Lima, gerente de
projetos da empresa)”. Caolho conta que a Politec já o procurara para oferecer
serviços de vistoria para carros.
Diz
Caolho: “Esse negócio foi o Marconi que pediu. (...) Ele (Perillo) ligou e eu
atendi. Não mandou recado, não. Ligou no telefone e falou assim, ó: ‘Eu tô aqui
com o Barros (da Politec). Você conhece ele? Ele vai te procurar. Você pode
receber ele aí hoje?’ Eu disse: ‘Posso, governador, manda ele vir aqui que eu
falo com ele agora’”. Perillo, segundo o relato de Caolho, é direto: “(Perillo)
falou: ‘Atende ele (Barros, da Politec) aí que é meu amigo, tá?’”.
Ao
perceber que o assunto já estava encaminhado no Detran, Cachoeira se irrita com
a pressão de Perillo e ordena que Caolho explique a situação aos executivos da
Politec. Diz Cachoeira: “Fala para eles (Politec): ‘O que foi politicamente
combinado já está fechado’”. Caolho também reclama: “Povinho estressado... E o
Marconi também tem uma memória de grilo”. “Mas aí você já passa lá amanhã e
resolve esse estresse”, diz Cachoeira.
Em
seguida, ele afirma que os executivos da Politec também pressionaram
Demóstenes. Noutra ligação com Cachoeira, cinco minutos depois, Caolho está
mais leve: “Amanhã resolvo isso. Hahaha! Eu acho divertido um negócio desses. O
governador manda receber o cara, o cara chega para mim e diz que conversou com
ele. (...) ‘O senhor (Barros, da Politec) só põe no papel aqui para mim que eu
vou autorizar’: foi essa minha conversa com ele (da Politec)”.
Os
interesses da Politec, do amigo de Perillo, foram atendidos. A empresa
conseguiu prestar serviços ao Detran, presidido por Caolho, sem licitação nem
contrato formal. O serviço de vistoria de carros, antes feito por múltiplas
empresas credenciadas, passou a ser executado exclusivamente pela Politec. Em
fevereiro deste ano, o Departamento Nacional de Trânsito, o Denatran, detectou
irregularidades no sistema oferecido pela Politec ao Detran de Goiás.
Descobriu-se
que a Politec não era homologada no Denatran nem repassava as informações das
vistorias ao banco de dados do órgão – brecha que permitia, em tese, que carros
roubados ou fora dos padrões de segurança fossem revendidos. Diante dos fatos,
o promotor Rodrigo Bolelli determinou ao Detran goiano que encerrasse a
contratação informal da Politec.
A
Politec, que nasceu em Goiânia, é uma grande empresa de tecnologia. Vale R$ 254
milhões e mantém contratos com governos estaduais, além do governo federal.
Desde que Perillo virou governador, no ano passado, recebeu R$ 8 milhões do
Estado de Goiás. Quando Barros abordou Perillo no ano passado, a Politec já
estava encalacrada com a PF. Em 2009, ela e outras três empresas foram alvo da
Operação Mainframe, ação conjunta da Polícia Federal e da Secretaria de Direito
Econômico (SDE) contra o cartel que presta serviços de informática ao governo
federal. Num dos endereços vasculhados pelos agentes da PF foram encontradas
anotações com nomes de políticos e valores anotados ao lado. Havia, segundo os
investigadores, o nome de um senador – a identidade dele é mantida sob sigilo.
As investigações desse caso ainda estão em curso.
Caolho
era mesmo próximo a Perillo? Ao que tudo indica, sim. Semanas depois da pressão
para a contratação da Politec, no dia 30 de março, Perillo foi jantar na casa
de Caolho, ao lado de Cachoeira – e admite isso. Escutas da PF revelam que
Cachoeira e Caolho esmeraram-se nos preparativos para o convescote. Num dos
áudios, Cachoeira afirma que levaria uma garrafa de vinho e uma de champanhe ao
encontro. Pouco antes da tertúlia, Cachoeira liga para Garcez e pede que se
apresse: Perillo deveria chegar antes do previsto. Esse jantar é um dos três
encontros que Perillo admite ter tido com Cachoeira. O segundo foi na sede do governo goiano. O terceiro, na casa
do ex-senador Demóstenes Torres (ouça o áudio).
As
novas investigações da PF também se referem a um segundo caso: a instalação em
Goiânia do VLT, veículo leve sobre trilhos. Na tentativa de criar uma agenda
positiva, Perillo reuniu secretários na semana passada para definir o
cronograma da licitação que escolherá a empresa responsável pela instalação do
trem. Perillo espera que, na segunda quinzena de agosto, o edital seja lançado.
O VLT deverá fazer a ligação leste-oeste da cidade, com 12,9 quilômetros de
extensão, uma obra incluída no Programa de Aceleração do Crescimento (PAC).
Segundo
a investigação da PF, as articulações do governo, no ano passado, para
implantar o VLT em Goiânia ficaram comprometidas porque o contrato fora
dirigido para a Delta. Num diálogo interceptado no dia 30 de março de 2011,
Garcez narra a Cachoeira uma conversa mantida com o presidente da Agência de
Transportes e Obras Públicas (Agetop) e tesoureiro de Perillo na campanha de
2010, Jayme Rincón. Nesse diálogo, segundo Garcez, Rincón disse que o
governador escolhera a Delta para administrar as obras. “O governador já tinha falado com ele (Rincón) sobre o
negócio do VLT e que é pra passar o negócio pra Delta”, afirmou (ouça o áudio).
Em
entrevista a ÉPOCA, Rincón disse não ter conversado com Garcez sobre o VLT:
“Não tem a menor consistência. Nem se cogitava o VLT. Esse assunto não é afeito
a minha área”. ÉPOCA perguntou a ele por que participara da reunião com Perillo
no início da semana, para tratar justamente desse assunto. Rincón afirmou que
acompanha temas de infraestrutura do governo goiano e que a única participação
da Agetop será ceder funcionários para elaborar uma carta-consulta ao BNDES.
As
investigações da PF trazem ainda um terceiro assunto à tona: o envolvimento de
Antônio Perillo, irmão do governador, com a quadrilha de Cachoeira. De acordo
com os áudios, ele pertencia ao clube dos que usavam aparelho Nextel para falar
com integrantes da turma do bicheiro. Numa das ligações, Cachoeira pergunta
onde Toninho está. Toninho diz que está na saída de Goiânia. Diante de um
convite de Cachoeira para encontrá-lo na sede da Delta Construções, Toninho foi
rápido: “Vamos agora” (ouça o áudio).
Em
outro telefonema, Cachoeira demonstra intimidade com ele. “Toninho, você me
chamou aqui e desligou o telefone. Tá parecendo aquelas biscates”, diz
Cachoeira. Em 8 de abril do ano passado, Cachoeira conversa com Roberto
Coppola, seu sócio argentino no ramo dos jogos de azar. Quando Cachoeira
informa a Coppola sobre a possibilidade de ir a Buenos Aires na Semana Santa,Coppola diz que Toninho também iria à Argentina no período
(ouça o áudio). Toninho chegou a acionar Garcez, em 14 de fevereiro
deste ano, para perguntar por que seu Nextel não funcionava. No mesmo dia,
Eliane Pinheiro, ex-chefe de gabinete de Perillo, pede a Garcez que verifique a
situação do aparelho, pois “Toninho está de viagem marcada para Miami”.
O
governador Marconi Perillo afirmou que “jamais disse a quem quer que seja” para
passar as construções do VLT de Goiânia para a Delta. “Esta afirmação é infame
e irresponsável. Como é que o governador poderia pedir a alguém para ‘passar
uma obra’ que não existia nem no papel nem se sabia ainda se seria executada?”,
afirma. Segundo Perillo, o projeto do VLT ainda está em fase de elaboração. Em
relação à Politec, Perillo afirmou que “todos os empresários que o procuram são
por ele encaminhados aos órgãos competentes para que se inteirem dos projetos e
assuntos relacionados ao governo”. Tudo isso, segundo ele, de forma
transparente. “As informações são prestadas pelos responsáveis por cada área do
governo sempre obedecendo aos princípios de ética, lisura e transparência.”
Perillo
foi questionado também sobre as relações de seu irmão com Cachoeira, incluindo
o aparelho Nextel doado pelo grupo do bicheiro. Perillo disse que a pergunta
deveria ser formulada ao irmão e que não tem conhecimento desse assunto. No
comunicado, Perillo disse que não mais se pronunciará a respeito de assuntos de
ordem pessoal. “Não cabe alimentar ilações retiradas fragmentadamente de mais
de 30 mil horas de gravações, com o único intuito de criar polêmicas e
estabelecer relações entre fatos que não se coadunam. Entre todas as gravações
divulgadas, não existe nenhuma comprobatória de negócio ou contrato que
efetivamente tenha beneficiado alguma pessoa ou empresa.”
A
crer na versão de Perillo, o que se lê, ouve e se descobre a cada dia nas
investigações da PF decorre não somente de uma sofisticada ação orquestrada
“politicamente” pelo PT, mas também de uma extraordinária sucessão de
coincidências e mentiras contadas por diferentes integrantes da turma de
Cachoeira. Coincidências e mentiras corroboradas por cheques, transferências
bancárias, atos de governo. É verdade que Garcez poderia estar usando
indevidamente o nome de Perillo e ter criatividade suficiente para inventar
recados ou acertos. Mas era amigo de Perillo, frequentava seu gabinete e lhe
entregava cheques de Cachoeira. O mesmo vale para Cachoeira, Cláudio Abreu, da
Delta, e para os demais personagens envolvidos nos repasses de dinheiro. Como
se descobre agora, o mesmo sinuoso raciocínio teria de ser aplicado ainda a
Caolho, Demóstenes, ao irmão de Perillo...
*****
Novo
depoimento e impeachment
Diante
das novas e graves denúncias da revista Época, que pertence à poderosa Globo, o
governador de Goiás parece que perdeu a pose. Ele passou a atacar duramente
“setores da imprensa”. Cadê aquele falso discurso tucano sobre liberdade de
expressão? Líderes do PSDB também passaram a criticar o “denuncismo da mídia” e
o “vazamento seletivo de dados sigilosos" da PF. Ou seja: o denuncismo e
os vazamentos só são válidos quando servem aos propósitos da oposição
demotucana.
As
reações intempestivas de Marconi Perillo e de alguns líderes tucanos só
evidenciam que a situação do governador de Goiás é cada vez mais delicada. Os
membros da CPI do Cachoeira já avaliam a necessidade de convocá-lo novamente
para depor. Cresce também a boataria sobre o possível pedido de impeachment do
governador. Parece que não dá mais para esconder que Perillo e Cachoeira eram
“muy amigos”!
Fonte Blog do Miro
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