Duas capas do jornal
de João Roberto Marinho são emblemáticas. Na de ontem, uma ordem para que o
Parlamento se enquadre diante da ordem do STF. Na de hoje, a denúncia de uma
rebelião do Congresso, como se o Legislativo não fosse um poder independente,
em defesa de suas próprias prerrogativas. Se isso não bastasse, editorial acusa
Marco Maia de agir como militante partidário. Detalhe: todos os partidos, menos
o PPS, dão apoio ao presidente da Câmara na disputa com o STF
247 - A
julgar pelas duas últimas capas do jornal O Globo, da família Marinho, o
periódico é um dos entusiastas da chamada "supremocracia", regime
político que se tenta implantar no Brasil e que coloca o Supremo Tribunal
Federal acima de todos os demais poderes.
Ontem, a chamada em negrito destacava
"Supremo cassa deputados e adverte direção da Câmara". Abaixo, o
subtítulo, que era quase um toque de recolher, e dizia: "Ministro Celso de
Mello faz duro alerta contra reações corporativas e diz que insubordinação é inaceitável".
Algo que poderia ser lido apenas como "enquadrem-se".
Hoje, a manchete também traduz uma tomada de
posição. "Congresso se rebela e manobra contra STF". Ou seja: o
parlamento não é mais um poder independente, que se vale de suas próprias prerrogativas,
mas um agente rebelado da República.
Se isso não bastasse, o jornal também publicou
editorial afirmando que Marco Maia age como militante partidário, esquecendo-se
de seu papel institucional que, na visão do Globo, seria simplesmente se curvar
à "supremocracia". Detalhe: todos os partidos, menos o PPS, dão apoio
ao presidente da Câmara dos Deputados na defesa das prerrogativas da Casa
Legislativa.
Abaixo, o editorial de hoje:
Crise institucional sem sentido - EDITORIAL O
GLOBO
O GLOBO - 19/12
Ao contrário do ministro da Justiça, o
presidente da Câmara, Marco Maia, agiu como militante partidário, deixando
papel institucional em segundo plano
Um julgamento em que se sentavam no banco dos
réus ex-dirigentes e ativos militantes do principal partido no poder, além de
representantes da base parlamentar do governo, não transcorreria mesmo sem
incidentes. Só não era necessário um arremedo de choque entres Poderes, com o
presidente da Câmara, Marco Maia (PT-RS), afrontando o Supremo Tribunal Federal
caso ele cassasse os direitos políticos e, portanto, os mandatos dos deputados
condenados como mensaleiros — João Paulo Cunha (PT-SP), ex-presidente da Casa;
Valdemar Costa Neto (PR-SP) e Pedro Henry (PP-MT).
Foi confirmada a cassação, no voto do ministro
Celso de Mello, o do desempate no placar de quatro a quatro neste item do
julgamento, e pelo menos Marco Maia baixou o tom: “Vamos usar todos os
mecanismos para convencer que não é razoável ingerência na prerrogativa da
Câmara”.
Ora, trata-se do entendimento do presidente da
Casa. Se o do Supremo for outro, vale este. É assim em qualquer processo.
Sensato, o próprio ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, foi ao ponto.
Para ele, “as decisões (do STF), depois de transitadas em julgado, valem como
lei e devem ser cumpridas, independentemente de avaliações subjetivas”. Cardozo
fez o certo, à altura da posição institucional que ocupa, de ministro de
Estado, não a de deputado petista licenciado. Lição para Marco Maia. Ele
deveria ser mais presidente da Câmara do que militante do PT.
A questão era controvertida, tanto que quatro
dos nove ministros habilitados a julgar o item entenderam que caberia à Câmara
cassar os parlamentares. Mas há outras interpretações, preferidas pela maioria
formada pelo voto de Celso de Mello. Foi vitorioso o entendimento de que o
autor de crime contra a administração pública, condenado a pena superior a
quatro anos, é cassado pelo Judiciário. Quem discordar impetre embargos na
tentativa de rever o veredicto. Não pode é dizer que não o cumprirá.
A polêmica não vale uma crise institucional. Ela
só interessa a uma minoria, a mensaleiros condenados. Estes que acionem seus
advogados. A estabilidade política e a segurança jurídica do país não podem
ficar subordinadas a um punhado de pessoas condenadas por sua mais alta Corte,
sejam políticos da aliança partidária no poder ou não. E fez bem o ministro
Celso de Mello ao incluir, em seu voto, a advertência de que descumprir decisão
do Tribunal é crime de prevaricação, previsto no Código Penal.
A sessão de segunda, a 53ª desde agosto, foi a
última do julgamento histórico do mensalão. Até o final de todo o processo, com
a redação do acórdão e a apreciação de embargos, passarão alguns meses. Quanto
menos tempo, melhor. Mas inexistem razões para que tudo não continue a
transcorrer como foi até agora.
Fonte
– Brasil247
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