A
CPI do Cachoeira voltou a produzir notícias interessantes: algumas positivas,
como a intenção do Ministério da
Justiça de rastrear bens do esquema Cachoeira no exterior; outras negativas,
como a última chicana judicial, entre dois magistrados de Goiás, que pode
resultar em cancelamento de toda investigação. A Polícia tem provas de que
houve vazamento da operação, e suspeita do juiz Leão Aparecido Alves, que tem
ligações com um dos sócios da máfia. Este juiz, por sua vez, entrou com
representação contra o colega responsável pela operação Monte Carlos, para
saber se foi investigado, o que poderia resultar em anulação de todo o
inquérito. Como não quero me preocupar à tôa, prefiro não acreditar que o
protesto de um juiz suspeito de corrupção possa atrapalhar o combate a uma das
máfias mais sinistras que já acossaram o Estado brasileiro.
Mas
a polêmica aliança entre Maluf e PT ainda está quente. É assunto do editorial da Folha de hoje,
de colunas da Cantanhede e Janio de Freitas (esta a
primeira a criticar Erundina); no Estadão, continuou o assunto principal na coluna da Dora Kramer; no
Globo, Merval Pereira usa o tema para falar de aloprados e
mensalão.
Então
falemos – espero que pela última vez – deste imbróglio. Tenho acompanhado com
atenção os desdobramentos deste caso junto à blogosfera. Um post do Nassif, criticando
Erundina, gerou mais de 500 comentários, quase todos acalorados. Li quase tudo,
para analisar o caso à luz não apenas das estratégias políticas de Lula, mas
considerando também as reações dos internautas.
As
conclusões a que cheguei, em relação à estratégia política do PT, são as
seguintes:
Lula apostou alto.
Não é possível que ele não imaginasse a reação da militância de seu próprio
partido. Foi uma estratégia eleitoral, maquiavélica e pragmática. Aliás, não
faz sentido jogar toda responsabilidade sobre Lula. O encontro com Maluf teve a
presença do presidente do PT, Rui Falcão e do candidato a prefeito, Fernando
Haddad. Todo mundo apostou alto.
Pode ter havido o
objetivo de produzir um factóide político de grande impacto midiático. Se
houve, foi bem sucedido. Se não houve esta intenção, foi uma consequência
positiva. A máxima “falem mal mas falem de mim” é uma das mais antigas da
política brasileira.
O alto custo político
para o PT de exibir para o mundo uma imagem tão forte como a foto de Haddad,
Lula e Maluf demonstra que o partido está realmente interessado em ganhar as
eleições em São Paulo. Disputar com José Serra não é brincadeira. O tucano joga
com armas pesadas, como se viu na eleição contra Dilma. A campanha deverá,
portanto, trazer ainda muitas polêmicas e baixarias.
O PT possivelmente
vai usar a privataria tucana contra Serra. Não teria sentido Haddad cometer a
valentia eleitoral de aparecer abraçado a Maluf e acovardar-se na hora de
denunciar os documentados crimes de Serra no processo de privatização.
As eleições
municipais deste ano estão sendo encaradas como extremamente estratégicas para
o PT nacional. Há o entendimento que é melhor pagar agora o preço das alianças
constrangedoras do que fazê-lo em 2014. Na campanha de reeleição de Dilma, PP e
PSB ver-se-ão em dívida com o PT, e não poderão fazer cobranças abusivas. É
melhor constranger Haddad agora do que Dilma em 2014.
Quanto
à Erundina, meu entendimento sobre sua postura é o seguinte:
Sua atitude pode ter
sido eticamente irrepreensível, mas foi uma dupla traição política ao PSB e ao
PT. Seu partido, o PSB, tem se caracterizado por um aliancismo ultrapragmático.
Foi aliado até poucas semanas atrás do governo Alckmin, e Erundina não se
desfiliou de sua legenda por ocasião da brutal desocupação de Pinheirinho, nem
dos ataques truculentos e sem planejamento à cracolândia.
Erundina não deveria
ter aceitado o papel de vice de Haddad, sabendo que entraria numa campanha
pesadíssima, e que o PP seria aliado do PT. Tendo aceitado, não deveria ter
recuado. Recebeu críticas? Ok, deveria ter feito o necessário e sempre difícil
enfrentamento político.
Na primeira
entrevista que deu à grande mídia, após aceitar a vaga de vice, Erundina fez
uma crítica leviana e mesquinha ao “slogan” da campanha de Haddad, dizendo que
falar em “novo” era preconceito contra terceira idade. Não era o caso,
evidentemente. Novo é um conceito que não tem relação necessária com a faixa
etária. Pode-se ser um velho de oitenta anos e ter um espírito jovial. De
qualquer forma, não cabe ao vice fazer críticas à campanha de seu próprio
candidato através da imprensa. Ou seja, Erundina já vinha roendo a corda desde
que embarcou na aliança com Haddad. Provavelmente por motivos pessoais,
ressentimentos antigos.
A incoerência de
Erundina foi levantada pela blogosfera política que trouxe à nossa lembrança a
campanha municipal de 2004, quando a candidata aceitou como vice o
conservador Michel Temer, do PMDB, e fez pose para fotos ao lado de Quércia, um
nome tão sujo e tão ligado ao conservadorismo paulistano quanto o de Maluf.
Ora,
Erundina foi ministra de Itamar Franco, após aceitar um convite sem prévia
discussão com seu próprio partido. O governo Itamar Franco teve o mérito de
criar o Plano Real e estabilizar a economia brasileira, mas também deu início
ao gigantesco desmantelamento do Estado, com o programa de privatizações. Era
um governo sustentado fundamentalmente pela direita – e Erundina estava lá.
A
conclusão, portanto, é que Erundina é mais um daqueles quadros com boas
intenções, uma pessoa proba, ética. Ao mesmo tempo, uma pessoa intransigente e
ressentida. É a antípoda de Lula, um político que o povo e o mundo inteiro
aprendeu a amar e respeitar por conta justamente de seu pragmatismo em favor dos
mais pobres, sua determinação de não se portar jamais com intolerância política
e jamais prejudicar as chances de levar forças populares ao poder por conta de
pinimbas com figuras do passado.
Algumas
considerações sobre Maluf:
É um ex-mafioso, um
bandidão decadente da política nacional. Não apita mais nada. Mas tem a palavra
final sobre o apoio do PP à Haddad e os minutos diários que esta aliança
representa.
Diante da maior
fragilidade de Haddad, que é a falta de conhecimento do eleitorado sobre sua
figura, o tempo de TV será fundamental.
Não se pode comparar
Maluf a Demóstenes Torres. Maluf é passado, um parlamentar apagado e sem
influência a nível nacional. Demóstenes é presente, e figurava nas cabeças de
uma poderosa máfia política.
Enfim,
trata-se de case político interessante, mas vindo de Lula não chega a
surpreender. O ex-presidente, desde que assumiu o figurino de Lulinha paz e
amor, caracterizou-se pela quase infinita tolerância com seus (ex) adversários,
desde que o objetivo fosse fazer o bem aos mais pobres; ninguém pode negar que
Lula efetivamente melhorou a situação destes. E para fazer algum bem aos mais
pobres, é preciso conquistar o poder. O povo humilde não tem os pruridos éticos
de classe média viciada em Facebook e Twitter. Ele não está nem aí para o fato
de Lula e Haddad visitarem a casa de Maluf. O povo quer uma vida melhor, ponto.
O julgamento da história à foto de Lula, portanto, virá na forma de votos e, em
caso de vitória, na avaliação objetiva da administração petista. Se trouxer alívio
à dura vida dos pobres paulistanos e significar mais um prego no caixão da
direita brasileira (que se perder na capital paulista, corre o risco também de
perder o governo do estado), a breve tertúlia com Maluf pode ter valido a pena.
Fonte:O Cafezinho
Do Blog O TERROR DO NORDESTE.
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