Estudante gaúcha lidera movimento para fazer a
Arena voltar ao cenário político brasileiro. Confira qual seria o ideário deste
novo/velho partido
Por Mario Henrique de Oliveira
Por considerar que “não há partidos de direita
no Brasil”, a estudante de direito Cibele Bumbel Baginski encabeça um movimento
para refundar a Aliança de Renovação Nacional, ou Arena, partido político que
comandou o Brasil durante os anos da ditadura militar. A moradora de Caxias do
Sul diz que a sigla resgatará valores como conservadorismo e nacionalismo, e
quer o partido já disputando as eleições de 2014.
Para o cientista político Benedito Tadeu César,
a iniciativa pode ser interessante pelo fato de haver uma direita que não se
declara como tal, mas é preciso respeitar os valores democráticos. “Na
democracia há espaço para todas as vertentes políticas e é legitimo eles se
declararem de direita, até porque há no Brasil uma cultura de quem é de direita
não se declarar abertamente. Então, nesse sentido é muito válido. Mas o nome
traz consigo toda uma história, é o partido que legitimou a ditadura, Se for
ficar no campo democrático, na disputa de votos, ok. Mas não foi isso o que a
Arena fez e isso não pode se repetir”, diz ele.
Essa é a principal preocupação de César, o
cuidado com a democracia e a História do Brasil. Ele argumenta contra posições
tomadas pela Arena que são bem vistos por Cibele. “Creditar o golpe como
antecipação a um suposto golpe de esquerda é puro achismo. É verdade que na
época havia toda uma insurgência da esquerda mundial, mas não há provas
documentais que evidenciem que o país iria sofrer um golpe comunista. Depois
disso, creditar crescimento econômico e outras coisas ao regime militar, temos
que ver até que ponto tudo isso foi conseguido, porque senão podemos falar a
mesma coisa da Alemanha Nazista, que teve índices sociais muito bons e a gente
sabe em troca do que”, completa.
Confira abaixo a entrevista na integra com
Cibele, realizada por e-mail, na qual ela conta um pouco das intenções da nova Arena
e sua visão política.
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Cibele Bumbel Baginski (Reprodução) |
Fórum – Cibele, você poderia nos dizer como está
a situação hoje da Arena? O partido já está registrado no TSE? Se não, o que
falta para ele voltar à ativa?
Cibele Bumbel Baginski – A Arena está em
processo de formação, reunião de documentação conforme cita a lei, registros em
cartório de pessoas jurídicas e, o mais complicado, a busca de assinaturas de
apoio à sua criação, que são quase 500 mil no cálculo atual da base legal, para
poder futuramente encaminhar isso ao TSE. Acredito que se tudo correr bem com o
plano de metas traçado para nossas ações, até meados de 2013 tudo esteja
concluído, nos tornando aptos a disputar as eleições de 2014.
Fórum – A intenção do partido é já participar
das eleições em 2014?
Cibele – Sim, se possível apesar dos prazos
apertados, desejamos poder atuar nas eleições de 2014 como sigla constituída e
já podermos apresentar nosso trabalho para mais cidadãos.
Fórum – Gostaria que você nos contasse um pouco
como surgiu a ideia de refundar o partido. Em uma entrevista você disse que o
nome foi escolhido entre vários outros possíveis. Vocês já não sabiam ou
imaginavam que com esse nome certamente iriam ganhar mais visibilidade e
atenção, para o bem ou para o mal?
Cibele - Sim, na votação para escolha do
nome e sigla haviam oito boas sugestões, mas a que mais trazia a ideia de
representação de uma aliança com intenções conservadoras e nacionalistas, como
nos declaramos abertamente, era realmente Aliança Renovadora Nacional, por isso
ele foi escolhido, acredito, pelos votantes. Mas eu tinha dúvidas, havia uma
ala dos aliados que estava considerando a possibilidade de escolher algo novo.
Mesmo assim, a força da ideia de trazer a Arena como um diferencial na política
já tão modorrenta atualmente para algumas pessoas, entre muitas considerações,
acabou fazendo este nome ser escolhido. Imaginamos que haveria pessoas que
gostariam da ideia, e outras nem tanto, mas não se pode querer agradar gringos
e troianos. Quando se toma posição, está-se sujeito a receber elogios, mas
também críticas, em qualquer caso, este só é um pouco mais barulhento.
Fórum – Defensores e opositores do período
militar brasileiro se dividem em chamar o ato de 1964 como revolução ou golpe.
Já vi entrevista sua chamando a queda do presidente João Goulart de
“revolução”. Porque acha isso?
Cibele – Vejo essa questão controversa entre
historiadores, por isso chamo o governo posterior a 1964 de Brasil pós-64, mas
mesmo que eu não deseje contestar especialistas maiores em História, que não é
minha área profissional, vejo pessoalmente esse momento histórico como
Revolução ou Contragolpe, pois o momento político indicava a possibilidade de
um golpe comunista, de acordo com várias notícias de 57 em diante nos jornais
da época ainda disponíveis para consulta em alguns arquivos, até onde me
lembro, e depois de algumas ações incisivas do governo João Goulart, que foram
o estopim naquela atmosfera política de momento. Tem que se observar que a
visão da época era bem diferente de muito do que vemos hoje também, ainda era
momento de Guerra Fria, entre outras coisas, mas, a meu ver, aquele decreto do
presidente Goulart estatizando um sem fim de terras ao redor de rios,
ferrovias, e outras estruturas, colocava praticamente todo o perímetro brasileiro
como estatizado e isso, pessoalmente, me parece francamente com o fim da
propriedade privada. Por isso tenho que concordar com o sentimento das pessoas
à época em se preocuparem com a situação e tomarem as ações que no momento
julgaram corretas, se eu estivesse lá, certamente poderia lhe dar uma opinião
mais exata, mas superficialmente isso coloca alguns dos motivos que enveredam
minhas análises pessoais.
Fórum – Um dos motivos que disse para o
surgimento desse novo partido era a falta de partidos de direita no cenário
político brasileiro. Você realmente acha isso? O que para você define
direita/esquerda?
Cibele – Sim, não há partidos de direita no
Brasil, no máximo, de centro, mas todos seguem uma linha que se aproxima cada
vez mais de posturas adotadas por ideologias de esquerda, sejam socialistas,
comunistas, social-democratas ou outras mais que poderiam ser enumeradas. Eu
cheguei a trabalhar em artigos sobre direita e esquerda, há muitos detalhes que
podem definir direita e esquerda em espectro político, entre outras teorias
gráficas, mas o que estamos mais acostumados a ver no Brasil é ver a esquerda
como alguma das já citadas ideologias (segui-las ou não depende da sigla de que
se fala e situação), e a direita é vista pelas pessoas geralmente como o mal
das privatizações, dos liberais extremistas ou personificado em algo como por
exemplo o governo FHC, ou então pela mídia negativa veiculada quanto ao momento
pós-64. Compreendo que é a visão comum, seja essa até por fatores afins, mas é
completamente faltosa com muitos outros fatos a serem pensados. Quem é que
disse que direita tem que ser liberal ao ponto de privatizar a mãe? E quem
disse que todos os atos de governo X ou Y foram malvados? As pessoas devem ver
com mais calma as coisas e atentar a mais informações para poderem formar uma
opinião realmente crítica e própria.
A Arena vem como aliança de várias tendências de
direita, conservadoras, nacionalistas, integralistas, militaristas,
monárquicas, liberais moderadas, entre outras que podem se entender bem
seguindo pontos pacificados, e tendo liberdade de pensamento para defender suas
ideias, que é pelo que o cidadão elege seu candidato, para que o represente
pelo que ele é, e não padronizando-se. Conseguimos representar uma direita
democrática, e trazemos à luz tantas outras doutrinas respeitáveis de direita,
que não são ruins como se estigmatizou. A direita é uma posição que preza pela
mudança ordeira e planejada para a evolução da sociedade, sem grandes baques ou
caos em ações repentinas e com efeito somente a curto prazo, tem um foco que
não radicaliza.
Quanto aos governos pós-64, assim como todos os
governos, têm seus erros e acertos, nenhum governo é perfeito, se fosse, não
seria proibido se reeleger mais de uma vez. É necessário dar a chance de erros
e acertos para outras lideranças. Se for olhar em um livro de História do
antigo 1º grau, lembro mais ou menos bem de quando vimos Revolução Francesa, em
que os sentados à esquerda eram os radicais e extremistas, e curiosamente,
liberais burgueses como chamados à época, e os da direita eram os moderados e
que desejavam estabilizar o país e consolidar conquistas para poder então
encontrar a paz e o desenvolvimento, sem mais derramamentos de sangue (não que
eles tenham conseguido, porque Robespierre guilhotinou mais um monte de gente
antes de ser vítima do próprio remédio).
Fórum – Em outra entrevista você disse que não
gostaria de ver o novo Arena ligado a figuras como Paulo Maluf. Há alguém em
especial da antiga Arena que você gostaria de ver apoiando a nova sigla?
Cibele – Da antiga Arena acredito que uma entre
tantas pessoas que me chamaram alguma atenção em questão de competência e
posição que talvez tivesse interesse em retornar à política seria o ex deputado
federal Victor Faccioni, mas é uma decisão que depende do interesse pessoal
dele. Algumas outras pessoas que eu gostaria de convencer infelizmente se
aposentaram da política. Enfim, faz bastante tempo que a sigla foi extinta e
muitos se afastaram da política por interesses pessoais ou outros fatores.
Fórum – Você não acha que os valores políticos
pregados pela Arena vão de encontro com a realidade política de hoje no Brasil?
Cibele – Certamente que os valores pregados vão
de encontro à realidade política do Brasil de hoje como um carro se espatifa em
um muro quando perde o controle. Quando chega um pessoal que se reúne e decide
que vai ser sincero e fazer alguma coisa ao invés de somente sugar o dinheiro
do contribuinte, isso é novidade. Dizer a verdade nunca foi um ato tão
revolucionário, a meu ver, porque simplesmente estamos dizendo o que pensamos e
oferecendo um espaço diferente para a troca de ideias e a chance de fazer
alguma coisa. Fazer mesmo, arregaçar as mangas e agir nem que seja preciso
caminhar por horas para descobrir um problema a ser solucionado, perder horas
de sono projetando uma solução para algo que é importante para o Brasil, não só
ficar brincando de alisar mutuamente o ego uns dos outros como se vê
infelizmente em muitas siglas que já foram respeitáveis algum dia. A realidade
política no Brasil tem sido desmoralizante, as pessoas estão cansadas e
pensando que nada mais poderá resolver as coisas, mas ao se retirarem da
política, estão simplesmente dando permissão para que coisas erradas aconteçam,
e é isso que tentaremos evitar, ao incentivar a cidadania e mostrar que é
possível sim mudar as coisas para melhor.
Fórum – Obviamente com o nome Arena, vão surgir,
e acredito que você já deve estar sentido isso, algumas contestações,
principalmente sobre isso ser um retrocesso e a ligação do partido com a
ditadura. Como você vem lidando com isso, e no que a novo Arena diverge e no
que ela é parecida com a antiga Arena, principalmente no que diz respeito a
princípios e valores?
Cibele – Há inspiração nos princípios de
conservadorismo e nacionalismo na antiga Arena, e assim como a antiga, esta
também é uma aliança de interpretações da direita em busca de uma participação
política séria. Surgiram e sempre irão surgir contestações porque, realmente,
não se pode agradar a todos, querendo ou não, mesmo sendo católica, devo ser
franca em dizer, nem mesmo Cristo conseguiu agradar a todos, apesar de os
cristãos continuarem se esforçando para evangelizar. Esse é um panorama também
da política, quando se toma um posicionamento, haverá quem será contra e quem
será favorável. As pessoas que não concordam dirão seus argumentos ou, na falta
deles, irão atacar a história da antiga Arena, associando tão somente ao nome.
Mas o que faz um partido é política, pautar propostas, desenvolver ações e
atuar para a melhoria do país com projetos de relevância sendo realizados.
Questionamentos sobre a história são importantes, claro, mas um partido não é
um museu ou uma instituição de pesquisa histórica, então isso deve ser deixado
para os profissionais, e a postura de partido político da Arena é de respeitar
a História do Brasil.
Ideias de retrocesso suscitadas podem ocorrer,
mas o Brasil certamente não teria metade das indústrias, estradas, ferrovias e
eletricidade que tem atualmente se não fosse pelos governos pós-64. Nenhum
governo é perfeito, mas estes governos fizeram o seu melhor para poderem
melhorar o país, e isso não deve lhes ser retirado, assim como quando qualquer
outro governo faz algo bom, e assim como o que é ruim em algum governo deve ser
analisado e alterado para algo que seja eficiente e bom no próximo. É por isso
que na democracia estamos, para termos uma renovação e dinamismo, permitindo a
evolução do país.
Fórum – Estamos vivendo a época das Comissões da
Verdade. Você acha importante investigarem as mortes no período militar?
Cibele – Pessoalmente, acho importante sim
investigar mortes terríveis, mas não somente de um dos lados do conflito
armado. Pesquisa histórica é sempre louvável, mas não se deve criar
sensacionalismo sob o falecimento de pessoas que merecem a paz para seu
descanso eterno, a meu ver. O que eu vejo nessa comissão infelizmente é uma
parcialidade que não tem precedentes, creio. Acredito que realmente para ser
uma Comissão da Verdade, ela deveria contemplar as mortes de todas as demais
pessoas que foram vitimadas pelos ataques terroristas decorrentes da oposição,
apurar realmente tudo, ou então fechar as portas e dar tudo por encerrado. Se é
pra fazer um trabalho pela metade então que não se faça nada e que se respeite
o descanso dos mortos.
Fonte
– revista Forum
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