por Conceição Lemes
Desde outubro de 2009, o Ministério Público
Federal (MPF) tem um site chamado Turminha do MPF. Destina-se a crianças de 6
a 14 anos de idade. Sobre o site, afirma:
O objetivo é contribuir para a formação da
cidadania de crianças e adolescentes e tornar o Ministério Público Federal mais
próximo de todos os cidadãos.
Para a concepção do conteúdo, foram selecionados
alguns temas prioritários de interesse da sociedade e pertinentes às funções do
MPF: cidadania, direitos humanos, patrimônio cultural, meio ambiente,
diversidade, equidade, justiça, ética, moralidade, democracia, corrupção,
violência e criminalidade.
Nos últimos dias, boa parte dos textos postados
no Turminha do MPF é sobre o “mensalão”. Um deles: O que foi o mensalão? Aí, está escrito:
No próximo dia 2 de agosto o Supremo Tribunal
Federal deverá iniciar o julgamento da ação penal 470, conhecida como Mensalão.
Para entender o esquema de corrupção que originou esse processo, a Turminha do
MPF narra aqui, aos seus leitores, os fatos que ocorreram entre os anos de 2003
a 2005 e que provocaram o oferecimento da denúncia pelo ex-procurador-geral da
República Antonio Fernando de Souza ao STF.
Em 2002, o Brasil elegeu como presidente da
República um trabalhador que pela quarta vez concorria ao cargo, Luis Inácio
Lula da Silva, ex-metalúrgico e líder sindical, além de fundador do Partido dos
Trabalhadores. Sua base aliada necessitava ser reforçada com o apoio de outros
partidos para que ele tivesse condições de governar e aprovar os projetos
sociais que havia prometido implementar durante sua campanha.
Como então conseguir o apoio de partidos que não
tinham afinidade ideológica com o PT? A partir dessa dificuldade, alguns
dirigentes do partido teriam montado um esquema de desvio de dinheiro público
para patrocinar o pagamento de propina a deputados federais de oposição e assim
conseguir o apoio deles no Congresso.
Chamou-nos a atenção um infográfico onde os réus
são apresentados como culpados, embora o julgamento só esteja começando. Um
outro, diz que o dinheiro foi usado “para dar a parlamentares em troca da
aprovação de projetos”.
Recebemos várias mensagens, criticando a
abordagem do site, já que é para crianças em processo de formação. Entre elas,
uma do jurista Marcio Sotelo Felippe, procurador do Estado de São Paulo.
Resolvemos então entrevistá-lo.
Viomundo — Esse tipo de informação é adequado a
crianças?
Marcio Sotelo —
Em uma democracia, o que se deve ensinar às crianças é que a História vem
estabelecendo, ao longo dos anos, alguns princípios básicos para a civilização.
Um deles é distinguir acusador e julgador. Isso é um dos legados do Iluminismo.
Antes, o processo era inquisitorial. A denúncia era prova. O acusado que se
defendesse. Infelizmente, o site do MPF reproduz o conceito de processo
inquisitorial. Como eles acusaram, o texto já declara os réus culpados. Se isso
realmente for mostrado para crianças, é um crime contra a democracia.
Viomundo – O site não diz nem mostra que os
acusados têm direito ao contraditório. O que o senhor acha disso?
Marcio Sotelo —
Um horror e ponto final. Não preciso dizer mais nada.
Viomundo – Esse tipo de informação ajuda a
formar um verdadeiro cidadão?
Marcio Sotelo – Não. Ao contrário. Oferece o risco de formar
cidadãos sem as noções básicas da ideia de democracia.
Viomundo — Qual a intenção do MPF com esse
material?
Marcio Sotelo —
Aparentemente o Ministério Público Federal esqueceu seu papel constitucional e
age como partido político interessado em enfraquecer outro partido político.
Mesmo porque está claríssimo que MPF não age com esse rigor quando os acusados
são de outro partido. É inominável o MPF usar crianças para fazer política
partidária.
Viomundo — O que deveria ser ensinado às
crianças?
Marcio Sotelo —
Os direitos e garantias fundamentais do artigo 5º Constituição Federal
são um bom começo. Presunção de inocência, contraditório, ampla defesa,
igualdade de todos perante à lei, entre outras coisas.
Fonte
Blog Viomundo
Nenhum comentário:
Postar um comentário