Por Mauro Malin
A Folha de S.Paulo e o Estado deram na terça-feira (14/8) a mesma manchete sobre o julgamento do mensalão. Reproduzem acusação do advogado de defesa de Roberto Jefferson segundo a qual o então presidente Lula ordenou a montagem do esquema de compra de apoio político. O Globo foi mais inteligente, com o título “Para enfraquecer procurador, Jefferson agora acusa Lula”. O advogado Luiz Corrêa Barbosa diria que, ao contrário de Lula, Folha e Estadão são patetas. Ou acham que seus leitores o são.
Jornalismo declaratório à parte, o fato é que até agora ninguém
conseguiu explicar o jogo duplo de Roberto Jefferson: antes, inocentava Lula;
agora, diz que seu advogado descobriu fatos que o teriam levado a, se os
conhecesse à época em que abriu sua boca larga, “jogar Lula no chão”. O
advogado de Jefferson soma-se aos que querem desacreditar o procurador-geral,
Roberto Gurgel. Mas isso só não explica o que está acontecendo.
Os jornalistas sabem muito mais do que podem escrever, mas não
têm provas, documentos. E dificilmente os terão. Assim, ficam limitados ao jogo
das aparências. Mas não precisariam ser literais. Há uma certa preguiça mental
quando de todo o trabalho de cobertura das sessões do Supremo resulta
reproduzir o que um advogado disse. Mais ainda quando ele já havia anunciado
essa fala.
O Globo, na edição de terça-feira (14), mais uma
vez acerta ao fazer um apanhado das figuras de retórica usadas por advogados:
nazismo, inquisição, novela, Flamengo, histórias bíblicas, Grécia antiga,
Código de Hamurabi e Teoria da Relatividade, exemplifica a reportagem.
Machado de Assis faz um personagem dizer ao filho:
“Sentenças latinas, ditos
históricos, versos célebres, brocardos jurídicos, máximas, é de bom aviso
trazê-los contigo (...). Melhor do que tudo isso, porém, que não passa de mero
adorno, são as frases feitas, as locuções convencionais, as fórmulas
consagradas pelos anos, incrustadas na memória individual e pública.”
As falas dos advogados foram retoricamente medíocres, da
primeira à mais recente, mas o que importa para eles e seus clientes é a
funcionalidade das defesas. Todas as comparações com o nazismo são, entretanto,
irresponsáveis. Ou será que esses advogados não conhecem o que aconteceu sob o
regime de Hitler? Evocando-o a propósito de fatos inteiramente diferentes, dão
aos jovens a noção falsa de que o nazismo pode ser comparado a essa ou aquela
questão judicial em regime democrático.
Tortura foi política de Estado
Em sessão da Comissão da Verdade no Rio de Janeiro, na
segunda-feira (13/8), Paulo Sérgio Pinheiro pôs o dedo na ferida. Entre os três
jornalões, só a Folha de S.Paulo registrou, já no título da matéria:
“Tortura foi ‘política de Estado’, diz Pinheiro”.
Isso explica por que é difícil para as Forças Armadas
brasileiras fazer uma revisão crítica do papel que desempenharam durante o regime
militar. Primeiro, seria o reconhecimento de que, sem violência e terror, teria
sido muito mais difícil, senão impossível, subjugar a oposição ao golpe e
impedir que a crítica chegasse amplamente ao público. Segundo, porque ao
ordenar que fossem cometidos crimes capitulados na Constituição e no Código
Penal, os chefes militares tiraram a legitimidade da hierarquia.
Vale a pena citar as palavras de Paulo Sérgio Pinheiro
reproduzidas na reportagem de Marco Antônio Martins, da Folha:
“Não foi abuso, não foi excesso: foi
uma política de Estado. As dezenas de jovens assassinados no Araguaia foram
mortos por uma política pública que dizia que eles não poderiam sair vivos de
lá. As casas de tortura também operavam por ordem dos ministérios militares. Se
não conseguirmos comprovar que todas as práticas de agentes contra militantes
foram políticas de Estado, falharemos em nosso papel”.
Na sessão, realizada na OAB do Rio de Janeiro, José Maria
Gagliassi relatou o sofrimento de ter sido torturado na frente da mulher e da
filha de 12 anos, que foram torturadas e violentadas na sua frente. Se a alta
hierarquia não tivesse sabido que isso se passava em quartéis sob seu comando,
poderia ter sido condenada por falta de exação. Isso inclui todos os
generais-presidentes.
Fonte Observatório da
Imprensa
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