A apresentação das defesas fez ruírem algumas
deduções e pretensas provas importantes para a acusação, ainda que sem alterar
os conceitos mais difundidos para a opinião pública sobre o caso mensalão.
Resta o voto de anunciadas mil páginas do ministro-relator Joaquim Barbosa para
esclarecimentos e contestações convincentes ao dito nas defesas. Caso os faça.
As 50 horas de acompanhamento (sem cochilos) das
sessões do Supremo Tribunal Federal não mudaram, a meu ver, o que me parece ser
um aspecto crucial do caso: a falta de comprovação da alegada finalidade de
compra de votos na Câmara, pelo PT. Houve, porém, a distribuição petista de
dinheiro. Com que finalidade, então? Não uma só, mas várias. Como está evidente
já a partir da identidade dos recebedores.
Quando deputados, todos aliados do governo.
Cujos votos, portanto, não se condicionavam à compra. Até por ter havido compra
dos não petistas muito antes da distribuição de dinheiro, e por outra
modalidade. Foi, em parte, na distribuição de cargos no novo governo, em
variados níveis, a título de retribuição à aliança eleitoral. Acordos feitos na
campanha presidencial e estadual de 2002, públicos e noticiados, como públicas
e noticiadas foram as nomeações compensatórias.
A segunda parte do custo das alianças foi o
compromisso de custear ou contribuir para as campanhas dos partidos aliados.
Um dos acertos dessa segunda parte foi também
noticiado: o encontro das cúpulas de PT e PL, ocasião em que Lula, como as
notícias expuseram, a certa altura disse a José Alencar, naquele momento
confirmado como candidato a vice: "Já acertamos o nosso lado [o lado
político, claro]. Vamos lá pra dentro e deixar eles acertarem o resto" [os
cargos e os cifrões, não menos claro].
A divisão societária variou em dinheiro e em
cargos, mas a conclusão das diversas alianças foi sempre a mesma. Na política
brasileira, é sempre a mesma, não importa que partidos façam a operação e que
candidaturas se envolvam.
Parte do dinheiro distribuído pelo PT foi, por
certo, em cumprimento aos acordos financeiros de aliança e campanha. De algum
modo o PT teria que quitar essas contas, mas saíra quebrado da campanha
presidencial, o que também foi objeto de noticiário bastante explícito. Marcos
Valério e o seu sistema propunham a solução.
Mas viria logo outra eleição, a municipal, na
qual o PT e a aliança governista projetavam conquistar nova base para seus
planos de poder nacional, continuado e politicamente ampliado.
Novos gastos, novas dívidas, novas operações com
Marcos Valério, suas agências de publicidade e seus contatos bancários.
Nessa série de compromissos e gastos se explicam
a alta quantia destinada a Duda Mendonça e a insignificância que figura, sem
sentido algum, como lavagem de dinheiro pelo Professor Luizinho; a distribuição
para petistas e para integrantes de partidos aliados; as diferenças de época da
entrega de dinheiro e dos montantes.
Nada disso excluiria a possibilidade de compra
de votos na Câmara. Mas, além de nenhum fato lhe dar nem sequer a mínima
comprovação, nem o senso comum sugere a compra de adesão de quem já é aliado.
Caixa dois, ou dez ou cem, o coerente e perceptível nesse caso, ao que posso
reconhecer até agora, é o aventureirismo eleitoral à margem da lei. E um ou
outro possível delito não eleitoral.
Mas as palavras a respeito, agora, estão com o
ministro-relator Joaquim Barbosa e o ministro-revisor Ricardo Lewandowski.
ENGANO
Fui citado como decano do jornalismo político
por engano. À minha frente há vários possíveis decanos de fato.
Janio de Freitas, colunista e membro do Conselho Editorial da Folha,
é um dos mais importantes jornalistas brasileiros. Analisa com perspicácia e
ousadia as questões políticas e econômicas. Escreve na versão impressa do
caderno "Poder" aos domingos, terças e quintas-feiras.
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