Por
Mino Carta
A mídia nativa entende que o processo do “mensalão”
petista provou finalmente que a Justiça brasileira tarda, mas não falha. Tarda,
sim, e a tal ponto que conseguiu antecipar o julgamento de José Dirceu e
companhia a um escândalo bem anterior e de complexidade e gravidade bastante
maiores. Falemos então daquilo que poderíamos definir genericamente como
“mensalão” tucano. Trata-se de um compromisso de CartaCapital insistir
para que, se for verdadeira a inauguração de um tempo novo e justo, também o
pássaro incapaz de voar compareça ao banco dos réus.
Réu mais esperto, matreiro, duradouro. A tigrada
atuou impune por uma temporada apinhada de oportunidades excelentes. Quem
quiser puxar pela memória em uma sociedade deliberadamente desmemoriada, pode
desatar o entrecho a partir do propósito exposto por Serjão Motta de assegurar
o poder ao tucanato por 20 anos. Pelo menos. Cabem com folga no enredo desde a
compra dos votos para a reeleição de Fernando Henrique Cardoso, até a fase das
grandes privatizações na segunda metade da década de 90, bem como a fraude do
Banestado, desenrolada entre 1996 e 2002.
Um best seller
intitulado A Privataria Tucana expõe em detalhes, e com provas
irrefutáveis, o processo criminoso da desestatização da telefonia e da energia
elétrica. Letra morta o livro, publicado em 2011, e sem resultado a denúncia,
feita muito antes, por CartaCapital, edição de 25 de novembro de 1998.
Tivemos acesso então a grampos executados no BNDES, e logo nas capas
estampávamos as frases de alguns envolvidos no episódio. Um exemplo apenas.
Dizia Luiz Carlos Mendonça de Barros, presidente do banco, para André Lara
Rezende: “Temos de fazer os italianos na marra, que estão com o Opportunity.
Fala pro Pio (Borges) que vamos fechar daquele jeito que só nós sabemos
fazer”.
Afirmavam os protagonistas do episódio que, caso
fosse preciso para alcançar o resultado desejado, valeria usar “a bomba
atômica”, ou seja, FHC, transformado em arma letal. Veja e Época
foram o antídoto à nossa capa, divulgaram uma versão, editada no Planalto e
bondosamente fornecida pelo ministro José Serra e pelo secretário da
Presidência Eduardo Jorge. O arco-da-velha ficou rubro de vergonha, aposentadas
as demais cores das quais costuma se servir.
Ah, o Opportunity de Daniel Dantas, sempre ele,
onipresente, generoso na disposição de financiar a todos, sem contar a de
enganar os tais italianos. Como não observar o perene envolvimento desse
monumental vilão tão premiado por inúmeros privilégios? Várias perguntas
temperam o guisado. Por que nunca foi aberto pelo mesmo Supremo que agora
louvamos o disco rígido do Opportunity sequestrado pela PF por ocasião da
Operação Chacal? Por que adernou miseravelmente a Operação Satiagraha? E por
que Romeu Tuma Jr. saiu da Secretaria do Ministério da Justiça na gestão
de Tarso Genro? Tuma saberia demais? Nunca esquecerei uma frase que ouvi
de Paulo Lacerda, quando diretor da PF, fim de 2005: “Se abrirem o disco rígido
do Opportunity, a República acaba”. Qual República? A do Brasil, da nação
brasileira? Ou de uma minoria dita impropriamente elite?
Daniel Dantas é
poliédrico, polivalente, universal. E eis que está por trás de Marcos Valério,
personagem central de dois “mensalões”. Nesta edição, Leandro Fortes tece a
reportagem de capa em torno de Valério, figura que nem Hollywood conseguiria
excogitar para um policial noir. Sua característica principal é a de se
prestar a qualquer jogo desde que garanta retorno condizente. Vocação de
sicário qualificado, servo de amos eventualmente díspares, Arlequim feroz
pronto à pirueta mais sinistra. Não se surpreendam os leitores se a mídia
nativa ainda lhe proporcionar um papel a favor da intriga falaciosa, da armação
funesta, para o mal do País.
Pois é, hora do dilema. Ou há uma mudança
positiva em andamento ou tudo não passa de palavras, palavras, palavras. Ao
vento. É hora da Justiça? Prove-se, de direito e de fato. E me permito
perguntar, in extremis: como vai acabar a CPI do Cachoeira? E qual será
o destino de quem se mancomunou com o contraventor a fim de executar tarefas
pretensamente jornalísticas, como a Veja e seu diretor da sucursal de
Brasília, Policarpo Jr., uma revista e um profissional que desonram o jornalismo.
Fonte
– Carta Capital
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