360
(Idem). Direção de Fernando Meirelles. Roteiro de Peter Morgan. Paris Filmes.
Com Anthony Hopkins, Rachel Weisz, Jude Law, Moritz Bleibtreu, Jamel
(Debbouze), Lucia Spisova, Gabriela Marcinkova, Juliano Cazarré, Maria Flor,
Marianne Jean Baptiste.
Os americanos não estão sabendo compreender e
curtir a proposta deste novo filme de Meirelles, a ponto de não perceberem que
ele é uma releitura do célebre La Ronde (Reigen), a peça de Arthur
Schnitzler que já foi filmada algumas vezes (La Ronde, 50, uma obra
prima de Max Ophuls, a Ronda do Amor, 64, de Roger Vadim com Jane Fonda,
e pelo menos cinco outras vezes, inclusive em O Círculo de Jafar
Panahi).
Basicamente é a história circular (tanto que o
filme foi chamado em Portugal 360: A Vida é um Circulo Perfeito), que
começa e termina com um mesmo personagem, no caso uma prostituta. O próprio
Fernando afirma modestamente que o filme é mais do obra do roteirista Peter
Morgan do que dele próprio (Peter acompanhou a filmagem e até a montagem e, de
certa maneira, conta sua história, já que ele é baseado em Viena, na Áustria e
muitas das histórias que conta ele viveu ou observou nas suas contínuas viagens
para a América ou Londres).
Para quem não lembra, Peter é britânico e
escreveu os roteiros de O Último Rei da Escócia, A Rainha (que
lhe deu indicação ao Oscar), Frost/Nixon (outra indicação), Além da
Vida, de Clint Eastwood, A Outra, Damned United/Maldito Futebol
Clube e outros. Mas Fernando conseguiu comprovar sua notável capacidade de
conduzir de forma perfeita um elenco vindo de diversas partes do mundo, alternando
estrelas com desconhecidos (ao menos para nós), com uma eficiente dupla de
brasileiros falando inglês (a encantadora Maria Flor e o Juliano Cazarré, em
franca ascenção). Todos estão ótimos, às vezes em papeis ingratos (Jude Law),
mas para comprovar a harmonia da direção, basta dar dois exemplos. Anthony
Hopkins está em um de seus grandes momentos, e o mais tocante é quando
participa de uma reunião dos Alcoólatras Anônimos e acrescentou aos diálogos
sobre sua própria experiência, quando há trinta e tantos anos conseguiu
vencer o alcoolismo (e a história que conta do padre é real). O outro exemplo é
com o jovem americano Ben Foster, que é daqueles que seguem a risca o método
Stanislawski (a ponto de não querer encontrar Maria Flor até quando realmente a
encontra no aeroporto). Ele tem a tendência de super representar, cair no
exagero e se perder. Mas não aqui. Como um ex-detento por ofensas sexuais que
está tentando se reabilitar, ele consegue criar tensão e mesmo simpatia.
A história começa em Viena, para onde vão duas
irmãs da Eslováquia, ansiosas para sair da vida de pobreza. A mais velha
concorda em se prostituir enquanto a mais nova lhe faz companhia, esperando o
fim dos encontros, arranjados por um gigolô de internet. Aguarda lendo romances
russos. Seu encontro seria com um homem de negócios inglês (Jude), que é casado
com uma editora de revista de modas (Rachel Weisz), que por sua vez o trai com
um fotógrafo profissional brasileiro (Cazarré). Mas ela quer terminar o caso,
só que é tarde porque a namorada dele percebeu tudo e está partindo de volta
para o Brasil. E assim por diante, até uma conclusão inesperada, quando vários
se encontram num hotel (embora tenha um adendo e Fernando, com uma
impressionante sinceridade, ache que não conseguiram encontrar um final de
maior impacto). Isso não me incomodou, porque durante todo o tempo me envolvi
com os personagens, seus problemas e dramas e principalmente com a narrativa
muito feliz, muito bem editada (pelo consagrado Daniel Rezende) e interligada
por canções de origens diversas (foi a mulher de Fernando que as escolheu).
O que eu admiro é a competência com que ele
orquestrou os diversos elementos, como a esplêndida fotografia de Adriano
Goldman (Jane Eyre, O Ano Em Que meus Pais Saíram de Férias), a
trilha internacional e o elenco heterogêneo. Ou seja, 360 é um filme
muito digno, sério, de qualidade. Para ser visto e apreciado.
Fonte
– Blog do Rubens Ewald Filho
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