Em editorial, jornal
de João Roberto Marinho faz lobby para que o plenário do STF siga o ministro
Joaquim Barbosa e rejeite a possibilidade dos embargos infringentes; assim, os
réus não teriam assegurados um direito básico, que é o chamado "duplo grau
de jurisdição"; segundo O Globo, embargos, aceitos em outras
oportunidades, significam "anular julgamentos"; também em editorial,
Estadão reforça pressão sobre o STF e afirma que "a luta continua"
247 -
O empresário João Roberto Marinho, editor do jornal O Globo, quer liquidar o
quanto antes a fatura da Ação Penal 470 – o chamado mensalão. Segundo ele, que
se expressou em editorial do Globo, os embargos infringentes não devem ser
aceitos pelo plenário do STF (embora sejam defendidos pelo decano Celso de
Mello e tenham sido admitidos em outras oportunidades), porque isso
significaria anular o julgamento. Com o editorial, O Globo recoloca a faca no
pescoço dos ministros do STF e deixa claro que só aplaudirá quem seguir suas
teses. Também em editorial, o jornal O Estado de S.Paulo, da família
Mesquita, reforça pressão sobre o STF e afirma que "a luta continua".
Leia os dois textos abaixo:
O noticiário em torno dos desdobramentos
jurídicos da condenação dos mensaleiros pelo Supremo transcorreu até agora em
torno do alcance dos embargos, "infringentes" e/ou
"declaratórios", impetrados pela defesa. Termos herméticos, esses
instrumentos jurídicos têm, na verdade, um alcance bastante amplo, por colocar
em questão a própria imagem da mais alta Corte do país e do Poder Judiciário,
revigorada pela demonstração de profissionalismo e independência — como
estabelece a Constituição —, ao condenar poderosos atuantes na estrutura
política que manda nos últimos onze anos em Brasília.
A defesa tem todo o direito de usar o arsenal
que o emaranhado de leis da Justiça brasileira oferece. Ousadia pelo menos não
falta a ela e clientes, pois até já foi defendido o afastamento do ministro
Joaquim Barbosa da relatoria do processo, nesta fase final, pelo fato de ele
ter assumido a presidência da Corte. Exemplo acabado de Jus esperniandi, na
fronteira da provocação.
A decisão, anunciada segunda-feira por Joaquim
Barbosa, de rejeitar embargos infringentes de Delúbio Soares, ex-caixa do PT,
condenado a oito anos e 11 meses de prisão, abre esta rodada final do
julgamento do mensalão. Dela a Corte pode sair desmoralizada se passar a ideia
de que tudo não passou de uma encenação para, no final, livrar mensaleiros de
maiores punições.
Barbosa foi firme ao rejeitar o recurso que pede
para o réu ser novamente julgado. Caso contrário, será uma derrota para o
Ministério Público, o relator e todos que votaram por alguma condenação num
julgamento minucioso, técnico, tendo sido garantido amplo direito de defesa.
O caminho dos embargos infringentes será
explorado por mensaleiros que obtiveram pelo menos quatro votos a favor em
qualquer condenação. Entre eles, as figuras estreladas de José Dirceu, José
Genoíno, João Paulo Cunha. Delúbio foi apenas o primeiro.
Joaquim Barbosa se alinha àqueles que consideram
não existir mais a possibilidade de embargos infringentes, embora constem do
regimento interno da Corte, de 1990. Sucede que a lei 8.038, posterior, deixou
de prever este tipo de recurso ao tribunal. É possível, apenas, o "embargo
declaratório", para tirar dúvidas de interpretação do acórdão, mesmo assim
a depender de aceitação do Pleno. O Ministério Público Federal
(Procuradoria-Geral da República) já se colocou contrário à admissibilidade
deste recurso, embora os ministros Gilmar Mendes e Ricardo Levandowski tenham
afirmado que mesmo os embargos de declaração podem levar à alteração de penas.
Caberá ao Pleno do STF decidir se acolhe a ideia
de anular julgamentos. É imprescindível haver a consciência do que isso
significará num processo que ajudou a consolidar o desenho republicano da
democracia brasileira, com a devida independência entre Poderes e a
Constituição acima dos interesses político-partidários ou quaisquer outros.
O resultado do julgamento da Ação Penal 470 pelo
Supremo Tribunal Federal (STF) inoculou na consciência cívica dos brasileiros a
esperança de que uma nova era no funcionamento da Justiça relegue à condição de
mera má lembrança a impunidade dos poderosos que historicamente tem
comprometido a consolidação do pleno sistema democrático entre nós. Poucos
meses após a condenação dos criminosos de colarinho branco que quiseram
transformar a política em balcão de negócios, em benefício de interesses
partidários, no entanto, já se começa a recear que o julgamento do mensalão se
transforme em enorme frustração nacional.
Na última segunda-feira o ministro Joaquim
Barbosa, relator da ação penal e hoje presidente da Suprema Corte, rejeitou o
embargo infringente apresentado pela defesa do ex-tesoureiro do PT Delúbio
Soares, condenado a mais de oito anos de prisão, que pleiteava novo julgamento
com base no argumento de que a condenação pelo crime de formação de quadrilha
foi decidida contra o voto de 4 ministros.
Para Barbosa, a legislação que rege os processos
no Supremo deixou de prever a existência de embargos infringentes: "Não
estando os embargos infringentes no rol dos recursos penais previstos na Lei
8.038/90, que regula taxativa e inteiramente a competência recursal desta
Corte, não há como tal recurso ser admitido".
Além disso, Joaquim Barbosa denunciou a clara
intenção protelatória dos recursos que objetivam apenas "eternizar o
feito" e advertiu para o fato de que o êxito de iniciativas desse tipo
conduziria inevitavelmente "ao descrédito da Justiça brasileira,
costumeira e corretamente criticada justamente pelas infindáveis possibilidades
de ataques às suas decisões".
Tem razão o presidente do STF. Mas o Direito não
é uma ciência exata e, portanto, depende sempre da interpretação da norma legal
- o que é, aliás, a função precípua dos magistrados. Além disso, existem poderosos
interesses políticos por detrás desse julgamento.
A isso se soma a circunstância de que o STF tem
hoje, e terá no futuro próximo, uma composição diferente daquela que decidiu
majoritariamente pela condenação dos réus do mensalão.
Tudo isso indica que não se pode deixar de
considerar a hipótese de que venham a ser aliviadas as penas originalmente
impostas aos mensaleiros, poupando alguns deles - e não é difícil adivinhar
quais - pelo menos do cumprimento da fase inicial da pena em regime fechado.
Diz a sabedoria popular que quanto maior a
altura, maior o tombo. Ao contrariar todos os prognósticos e, numa decisão
histórica, condenar figurões da política pela compra de apoio parlamentar para
o governo de turno, o STF levou às alturas o brio e o orgulho cívico dos
brasileiros que entendem que a coisa pública deve ser espaço privativo de
homens honrados e, com a mesma convicção, acreditam que numa sociedade
democrática todos são iguais perante a lei.
A reversão dessas expectativas no emblemático
caso do mensalão, se ocorrer, terá o efeito inevitável e absolutamente
lamentável de fazer despencar das alturas a que foram alçados nesse episódio
tanto o prestígio da Suprema Corte quanto a recuperada fé dos brasileiros no
manto protetor da Justiça.
A construção de uma sociedade justa e
desenvolvida não é responsabilidade apenas do poder público. É meta inatingível
sem a adesão de toda a sociedade, que só supera a tendência natural do
indivíduo de, na adversidade, pensar antes em si próprio, se realmente
acreditar nos valores a serem perseguidos e tiver fé naqueles que a conduzirão
nessa jornada. O descrédito nos governantes é um atalho para o caos.
Assim, a recente decisão de Joaquim Barbosa
significa mais um revés para os mensaleiros e a confirmação de que a Suprema
Corte continua dando uma contribuição importante para manter o País no rumo da
verdadeira Justiça.
Mas ela não é a palavra final nesse lamentável e
rumoroso episódio, o maior escândalo da história recente da política
brasileira. É aí que reside o perigo.
Fonte
– Brasil247
Nenhum comentário:
Postar um comentário