Internado desde o
início do ano no hospital Sírio-Libanês, em São Paulo, empresário enfrentava um
câncer cujas informações não foram divulgadas ao longo do tratamento; anúncio
da morte ocorreu na noite deste domingo, em São Paulo; dono de sorriso largo, irritava-se
diante do simples pronunciar de algumas siglas, como PT, CUT e MST; Roberto
Civita comandou a passagem da revista Veja, a de maior circulação do País, do
centro para a direita do espectro político; sua fortuna pessoal foi estimada
pela revista Forbes em US$ 4,9 bilhões, o que o incluiu na lista dos 300 homens
mais ricos do mundo
247 –
Do pai, Victor, o empresário Roberto Civita herdou a expressão vivaz, o sorriso
rasgado e, claro, o Grupo Abril, maior conglomerado editorial da América
Latina. Aos 71 anos, nascido em Milão, na Itália, ele estava internado desde o
início do ano no hospital Sírio-Libanês sob regime extremamente restrito de
divulgação a respeito de seu estado de saúde. O anúncio de sua morte foi feito
na noite deste domingo 26, em São Paulo.
Civita assumiu a presidência do Grupo Abril em
1990, com o falecimento do pai. No mês passado, ciente da gravidade de seu
quadro clínico, transmitiu para seu filho Giancarlo as presidências executiva e
do conselho de administração do grupo. Fundada em 1950, a Abril conta
atualmente com 9,5 mil empregados e publica 52 revistas diferentes, entre elas
Veja, a de maior circulação do País. O grupo faturou R$ 2,9 bilhões no ano
passado. Segundo a revista Forbes, Roberto Civita acumulou uma fortuna pessoal
de US$ 4,9 bilhões, tornando-se um dos 300 homens mais ricos do mundo.
Amante de barcos, restaurantes sofisticados e
viagens pelo mundo com a esposa Maria Antônia, Roberto Civita foi um editor
polêmico. Ao contrário do pai, que costumava respeitar, no dia a dia, a
autonomia de suas redações, entre as quais a da própria Veja, Roberto sempre
foi bastante presente na determinação dos alinhamentos editoriais de suas
publicações. Em sua gestão de mais de 20 anos à frente do grupo, passou a ser
comum editores serem chamados à sua sala, no topo do Novo Edificio Abril, o
Nea, em São Paulo, para recitais de enquadramento político-editorial.
Amigo do ex-presidente Fernando Henrique
Cardoso, Civita atuou para dar sustentação editorial ao governo tucano,
posicionando-se, diante do sucessor Luiz Inácio Lula da Silva, em permanente
antagonismo. Após ter experimentado, entre 1990 e 2000, uma década de ouro, a
Abril passou a lançar mão de sua posição de destaque no mercado editorial para
fustigar o governo Lula. Nos negócios, a empresa se complicou ao multiplicar
suas dívidas em dólares, a ponto de enfrentar cobranças pesadas de bancos
europeus que a havia financiado. Civita, em meados dos anos 2000, planejou
vender a gráfica do Grupo Abril – a de maior capacidade de impressão da América
Latina – para enfrentar o endividamento, mas uma bem sucedida renegociação,
além da falta de compradores, evitaram essa atitude. Numa negociação
internacional jamais explicada integralmente, a Abril vendeu, segundo
informação oficial da empresa, 30% de seu capital ao grupo sul-africano
Naspers. Os estrangeiros assumiram a compra de 13,8% do capital que pertenciam
aos fundos de investimento administrados pela Capital International, desde julho
de 2004.
Com os problemas financeiros resolvidos dessa
forma, Civita sentiu-se fortalecido para acentuar sua oposição praticada pelo
flanco direito da administração do PT, partido que não ostenta nem sequer cinco
linhas contínuas de elogios na revista Veja, mesmo tendo vencido as três
últimas eleições presidenciais e se tornado o mais votado do País no último
pleito.
Civita não era dado a olhar os fatos sem o viés
da editorialização. Em sua gestão, Veja multiplicou o tamanho de sua redação,
mas passou a acrescentar comentários, em lugar de notícias, suas páginas. No
ano passado, Roberto Civita liderou pessoalmente uma pesada bateria de pressões
sobre parlamentares da CPI do Cachoeira, no sentido de impedir a convocação do
editor-chefe de Veja, Policarpo Jr. O jornalista correu o risco de ser chamado
a depor sobre suas relações com o contraventor Carlinhos Cachoeira, com quem
foi grampeado pela Polícia Federal em combinações de matérias jornalísticas do
agrado do bicheiro e de ataque aos adversários dele. Lançando mão do recém
contratado banqueiro Fábio Barbosa para o comando da Abril, Civita o enviou a
diversas missões políticas em Brasília, com o sentido de garantir a ausência de
Policarpo da CPI. O presidente das Organizações Globo, João Roberto Marinho, atuou
ao lado de Civita e Barbosa para barrar a presença do jornalista na CPI.
Venceram, mas fora das páginas da mídia tradicional o público ficou sabendo da
profundidade das ligações perigosas entre Veja e o submundo político.
Dentro de seu grupo, Roberto foi o principal
arauto da importância da migração de suas publicações para a mídia internet.
Ele percebeu, desde os tempos em que aceitou vender sua gráfica, os custos
extremados das publicações em papel. Para dinamizar o site de Veja, porém,
recrutou colunistas de um único discurso ideológico, marcando posições
ajustadas ao pensamento mais conservador presente na classe média. Se a
intenção era irritar Roberto Civita, bastava, por exemplo, pronunciar diante
dele algumas siglas para tirar-lhe o sorriso do rosto: MST, CUT, PT e outras
correlatas.
Internado desde o início do ano no hospital
Sírio-Libanês, Roberto Civita recebeu, ali, a solidariedade pessoal do
ex-presidente Lula, também submetido, no ano passado, a um tratamento contra um
câncer na garganta. Ao contrário de Lula, que optou por divulgar informações
diárias sobre seu estado de saúde, inclusive com a distribuição de fotografias,
Civita, mesmo sendo, em tese, um editor de notícias, escolheu o segredo. Os
rumores dão conta de que seu falecimento se deu em decorrência de um câncer na
próstata.
No dia a dia da Abril, Civita procurava fazer as
vezes do bom patrão, profícuo em elogios aos funcionários mais antigos, aos
quais chamava de "pilastras" de seu grupo empresarial. Era muito
ligado ao vice-presidente Thomaz Souto Corrêa, de atuação estratégia nas
gestões do "seu" Victor, como era chamado o fundador do grupo, e do
"doutor" Roberto. A decisão de segmentar as publicações da Abril,
hoje com 52 títulos diferentes, nasceu das reflexões de Thomaz.
Em oposição à fama de "sovina" do pai,
que ergueu a Abril a partir da publicação das revistas infantis do grupo
americano Disney, entre as quais o Tio Patinhas – Pato Donald foi a publicação
inagural da companhia --, Roberto cultuava o perfil duplo de empresário work-a-holic
e, ao mesmo tempo, bon vivant. Gostava de ser visto no comando direto da
empresa, mas não fazia questão de esconder suas longas viagens ao redor do
mundo e as constantes aterrissagens em seu apartamento de Nova York. Formador
do perfil ideológico do Grupo Abril, ele escolheu o filho Giancarlo, em
detrimento dos executivos do carreira do grupo, para seguir sua obra. As
projeções, no campo editorial, convergem para o continuado posicionamento à
direita do espectro político da Abril e suas publicações.
Fonte – Brasil247
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